terça-feira, 18 de setembro de 2007

"dorme, vecchio."

Aqui em casa tem uma coisa que gira em torno dos computadores. Todos nós usamos, todos os dias e muitas vezes. É trabalho, estudos ou entretenimento. Pra piorar, meu pai tirou licença médica e férias. O velho está aqui o dia inteiro, quase todo o momento no computador, fazendo seu mestrado. É ele levantar para ir ao banheiro que “rapidinho, pai! Só vou ver meu email!” Mas ele não deixa por menos “é eu sair que alguém já se apodera do computador!”. E assim é o dia todo. Tanto que, muitas vezes, eu estou na cozinha e venho pra sala pra procurar alguma coisa e, automaticamente, ele diz: “já estou saindo, filha” “Mas eu nem vou usar, eu tou ocupada”. E agora ele deu pra ficar ouvindo mp3 “Ah pronto, agora que ele não sai do mundinho dele”, diz minha mãe. Ontem precisávamos usar o computador pra fazer um projeto para a aula de metodologia e ele achou ruim. Senta no canto mais afastado do sofá pra assistir TV e, quando percebemos, estamos gritando, porque a TV está numa altura insuportável “Abaixa o volume!”, reclama minha mãe “Ah, ele quer chamar atenção!” afirma meu irmão, sem mencionar os inúmeros “Ô, pinduca!” que falamos pra ele.

Ontem teve a cena mais bizarra de todas. Meu pai, com dor de cabeça e cansado, foi dar uma deitada no quarto. Minha mãe atende o telefone e uma mulher pede pra falar com ele, dizendo que era de uma editora. E minha mãe, então, pergunta: “Editora Pini?” e a mulher, surda, responde: “Sim”. Como meu pai estava esperando a ligação dessa mulher, levou o telefone pro meu pai. Tempos depois, ele aparece na sala, eu e minha mãe em pé, meu irmão em um dos computadores e meu pai com o telefone na mão. No exato momento que ele apareceu, foram instantâneos “Pinduca! Usa aqui, Pinduca!” “Tá livre esse aqui, pai” (minha mãe apontando para o computador desocupado e eu “É, pai, usa esse!” E ele “Gente, eu tou falando aqui com a mulher”, “a mãe”, pensei. Só então ele, no ritmo dele, tampa o telefone para a mulher não ouvir o que a gente estava falando. Mas claro que ela ouviu, a gente tava gritando... enfim, eu tive uma crise de riso e tive que sair de perto e, pra completar, era da editora Abril, não Pini, como meu pai estava esperando.

Essa cena é apenas uma, dentre tantas. Todas frutos de uma convivência contínua e forçada mas, nem por isso, desagradável. Nos damos todos muito bem.

E claro, assim que fomos para a faculdade, ele sentou feliz, em seu computador.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

não fale com estranhos a menos que eles falem com você

Sexta eu fui caminhar. Foi meu terceiro dia de caminhada neste ano, já que não o fazia desde que eu comecei a sentir dor na minha perna esquerda, no dia quatro de janeiro.

Andando pela avenida, várias pessoas surgiram com cata-ventos coloridos em verde e amarelo. Só então me liguei: 7 de setembro, festa da independência do Brasil. Na hora do almoço minha mãe comentou alguma coisa sobre verde e amarelo, o que me fez pensar que tinha jogo no dia.


Pessoas não paravam de surgir e mais e mais e mais até que eu não conseguia mais andar em linha reta, só desviando, mesmo. Mesmo assim, resolvi continuar no meu caminho de sempre, indo em direção à festa. Muitos vendedores ambulantes, muito barulho, escola desfilando, muita gente e, claro, muita sujeira.


No meio do caminho uma menina me abordou:


“Você vai lá pro lado do parque Okamura?”

“¬¬ Vou” (Na verdade eu não ia atééé o parque, ia voltar um pouco antes.)

“Então eu vou pegar carona com você. Ai, menina, porque minha amiga disse que ia comigo mas daqui ela vai direto pro trabalho.” (Não vou carregar você, não)

“A essa hora?” “Ela é babá” “Ahn...”

“Aí eu tenho medo de andar sozinha e não acho nenhum moto-táxi por aqui e o ônibus não ta passando. Ai, me arrependi, muita gente , uma menina passou mal, acho que não comeu. Porque a gente tem que se alimentar direito quando vai fazer essas coisas. E eu ainda briguei com meu namorado e vim sozinha. Agora eu tou com medo de ir andando.”

Tinha MUITA gente por lá.

[Parabéns pra Cuiabá, para Mato Grosso e toda a sua gente!] (pensei que ia citar o Brasil)

“Eu sempre andava nesse horário ou até um pouco mais tarde, nunca aconteceu nada. Bom, mas você está com o celular, né. Eu não carrego nada, já pra evitar roubo, essas coisas.”

“Ah, não é tanto o problema de roubo, não. É que eu tenho medo, mesmo.” (¬¬) Uma vez (...) chamei um moto-táxi e o cara ficou falando um monte de moage pra mim e eu fiquei com medo.” “Dar em cima?” “É, aí eu fiquei com medo.” “Tudo bem, eu te acompanho” (sigh)

“Você mora pra cá?” “Não, eu moro pra lá. Eu estou caminhando.” “Nossa, eu também quero caminhar, quero perder barriga mas eu não tenho tempo de fazer academia. E eu não gosto de andar sozinha. (Não diga). Se tivesse alguém pra andar comigo eu caminhava todo dia”

[“Olha o cremosinho! Um realzinho o salgado!”]

“É, eu gosto.” “Mas então, o que você teve na perna?” “Já ouviu falar em trombose? Então...” (resumo da história) “Mas você tem filho?” (como assim?)

“Não, sou muito nova pra ter filho. Eu só estudo. Você estuda?” (carteirada) “Tou no segundo ano.” “Então você tem 16 anos?” “Tenho vinte!” “É porque quando eu estava no segundo ano eu tinha 16.” (carteirada 2) “Ah, eu brinquei muito. Ah, olha ali, acho que é moto-táxi! Vou lá ver!”

Esperei deste lado.

“Amiguinha! Eu já vou indo, então! Tchau, obrigada!” (amiguinha) “Tchau!”

[Fulana de Tal, sua mãe te espera aqui no palco]

Não sei o dela e ela não sabe o meu nome. Melhor assim.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

dialogue

"You are too young to be here.
Sorry?
You are too young to be here!
Não tou entendendo o que ele tá falando...
Acho que ele tá dizendo que você é muito jovem pra estar aqui...
Oh! Yeah, yes, I am...
Why you are here?
Thrombosis.
Well... you are too young to be here..."
Não conseguia entender o inglês daquele senhor de idade, na fila para o exame de sangue. Sotaque diferente do que eu estava acostumada e boca meio caída dificultaram um pouco. Mas a conclusão à qual ele chegou só poderia ser uma: that I was too young to be there.

sábado, 1 de setembro de 2007

solidão

Depois de um dia de desespero, eu me via mais aliviada. Havia trocado de roupa, colocado o pijama do hospital, enrolada no roupão, também do hospital. Caminhei (mancando, por causa da dor) silenciosamente até minha cama, a penúltima naquela ward de 26 leitos. Era em torno de 11 e meia da noite. As luzes apagadas, a maioria das pacientes dormindo, algumas enfermeiras também e eu me deitei. Com um leve frio na barriga, por não ter previsto que um dia eu estaria num lugar como aquele, com tanta gente que eu não conhecia, num país que não o meu, falando uma língua que não a minha. Um tanto quanto sozinha, assim eu me senti. E ainda assim me sinto, hoje.